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Jojo Wachsmann: Você vai pagar para ver de novo?

Em seu mais recente livro, Bill Gates novamente se presta a fazer o papel do mensageiro. Como o sagrado Kirin na mitologia japonesa, ele carrega o prenúncio de um novo desastre

Em seu mais recente livro, Bill Gates novamente se presta a fazer o papel do mensageiro. Como o sagrado Kirin na mitologia japonesa, ele carrega o prenúncio de um novo desastre

Por Jojo Wachsmann, sócio-fundador e CIO da Vitreo

Quando a pandemia do Coronavírus começou, em 2020, um dos primeiros vídeos a viralizar foi o de uma apresentação que Bill Gates havia feito para o Ted Talks, em abril de 2015.

Em “The next outbreak? We are not ready”, algo como “O próximo surto? Não estamos preparados”, Gates precisou apenas de 8 minutos para fazer um alerta, que, à época, foi considerado mais alarmista do que alarmante.

Cinco anos depois, apesar de alguns extremistas terem usado a assertividade premonitória dessa palestra como pista do envolvimento de Gates e da Microsoft na fabricação da Covid, ficou claro que o alarme era real e infelizmente não foi considerado com a devida atenção.

Nem por nós, nem pelas autoridades e pelos governos mundiais.

Hoje, um ano e meio depois do seu início, ainda estamos lidando com as feridas emocionais, físicas e econômicas da pandemia.

Não sei você, mas me vejo agarrado à narrativa otimista de acreditar que a ciência, por meio da vacinação em massa, finalmente parece estar vencendo a luta contra a pandemia (e, também, contra os negacionistas).

Ao mesmo tempo, sigo, com um certo receio — e por que não pavor —, os relatos sobre os estragos da variante Delta (e das próximas letras gregas que podem estar nos esperando na próxima esquina).

E agora, em meio a isso tudo, no meio dessa ressaca, um novo alerta parece surgir.

bill gates

O próprio Gates, em seu mais recente livro, “Como evitar um desastre climático”, lançado em fevereiro, novamente se presta a fazer o papel do mensageiro. Como o sagrado Kirin na mitologia japonesa, ele carrega o prenúncio de um novo desastre.

kirin mitologia

Outros mensageiros já fizeram esse alerta antes. O pensador Yuval Harari, autor dos best-sellers “Sapiens” e “21 lições para o século 21”, fala em suas palestras e vídeos que só desacelerando o crescimento econômico resolveremos o problema do aquecimento global.

Al Gore, vice-presidente norte-americano durante os mandatos de Bill Clinton, ganhou o Nobel da Paz, em 2007, com seu ativismo em relação às mudanças climáticas. Seu premiado livro “An Inconvenient Truth”, de 2006, foi retratado no documentário de mesmo nome e ganhou um Oscar no ano seguinte.

E agora o assunto parece estar realmente “esquentando”.

Na última segunda (9) ganhou as manchetes do mundo todo a divulgação do novo relatório sobre mudanças climáticas do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC, que dividiu o prêmio Nobel com Al Gore em 2007).

As conclusões, baseadas nos estudos de centenas de cientistas espalhados pelo mundo, parecem claras: estamos diante de mudanças sem precedentes. E pior, algumas delas já sem volta.

As emissões de gases-estufa já tornaram irreversíveis o degelo das calotas polares e das geleiras, as mudanças nos oceanos e o aumento do nível do mar, que já subiu 20 cm nos últimos 120 anos. No ritmo atual o nível do mar subirá meio metro até o fim deste século.

O ponto de maior repercussão na mídia, nesses primeiros dias, é a estimativa de que o limite de aumento de 1,5°C no aquecimento global será atingido em 2030, dez anos antes da previsão que o IPCC fizera em 2018. Boa parte da discussão política por trás do acordo de Paris, em 2015, foi justamente sobre a importância desse 1,5°C…

O relatório coloca o dedo bem na ferida.

Nós somos os principais culpados pelo aquecimento global.

E vamos sentir os seus efeitos, no aumento das temperaturas, nas chuvas acima dos níveis normais e nos prolongados períodos de seca, com impacto na agricultura e em outras atividades, no mundo todo.

A única salvação, segundo os cientistas, estaria nos cortes agressivos nas emissões, rápidos e generalizados, que, desde que comecem já, poderiam limitar o aquecimento global para além de 2050.

Preocupante, não? Sair da pandemia e entrar em outra batalha épica. Será que temos condições de enfrentar mais essa?

Na minha visão, cética e anedótica, não! Ou ainda não. Explico.

É verdade que muito se tem falado sobre os problemas do clima.

Os critérios ESG, sigla para (E) Environmental (ambiente), (S) Social e (G) Corporate Governance (governança), estão estampados em praticamente todas as plataformas e materiais de venda de produtos de investimento mundo afora.

A mídia também está atenta a essas pautas. Governos e gestores de risco se mostram atentos para evitar que o próximo cisne negro não apareça pintado de verde.
(Li sobre o “Green Swan”, no relatório do BIS/Banque de France, que a Ana Luci Grizzi, advogada especializada em ESG, me indicou quando comecei a escrever este Diário de Bordo).

Por que, então, estou tão cético?

Muita gente fica com o pé atrás dizendo que essa hype do ESG é apenas greenwashing, ou seja, uma fantasia sem profundidade, que as empresas estariam vestindo para ficarem bonitas na foto com seus clientes e consumidores.

Mas o meu ponto é outro, mais prático talvez. Ainda não estou vendo dinheiro de verdade indo atrás dessas ideias. Para não ir muito longe nem divagar sobre o assunto, vou lhe mostrar os números da Vitreo.

Lançamos alguns produtos diretamente alinhados com o tema.

Primeiro, foi o FoF ESG Carbono Neutro, que, além de investir em gestores de ações brasileiras que usam critérios ESG na escolha das ações, direciona parte da sua receita para cancelar a emissão de gases de efeito estufa. Depois, o Franklin W-ESG (em cogestão com a Franklin Templeton), que investe em ações globais que consideram a diversidade de gênero e as questões ambientais, sociais e de governança nos investimentos.

Neste ano, lançamos mais 4 fundos totalmente ligados às conclusões do relatório do IPCC: Urânio, Carbono, Água e Hidrogênio (lançado nesta semana, detalhes abaixo). E na semana que vem, chega o Energia Limpa (sempre cabe um spoiler…).

Todos causaram algum frisson no lançamento. Eu mesmo dei várias entrevistas sobre a tese de cada um. Mas, no final do dia, você acha que eles captaram bem?

A resposta infelizmente é não, ou não muito. No total até agora, 9.485 clientes investiram em pelo menos uma dessas teses. Um bom número. Em termos de volume financeiro, porém, representa menos de 1% do volume de recursos custodiados na Vitreo.

Minha hipótese é que o assunto é bom para aquela conversa no jantar, para impressionar em um primeiro encontro, para o relatório de final de ano, para o site da empresa, mas ainda não esquentou o suficiente para chegar até onde a coisa pega, o bolso. É o greenwashing da pessoa física.

Tenho a sensação de que essa preocupação com o clima, o meio ambiente, a pauta ESG é como um “opcional” para a minha geração e as anteriores. Não aprendemos sobre isso desde pequenos. Se o fizemos, foi por opção e muitos sequer optaram.
Minha esperança está na próxima geração. A geração dos meus filhos, das minhas enteadas, que parece ter vindo “de fábrica” com essa preocupação – e não mais apenas como um opcional.

Aprenderam desde cedo que a água é escassa, então têm que fechar a torneira; que diversidade não é apenas uma palavra bonita ou uma parada colorida nas ruas. Parecem legitimamente preocupados com poluição, energia limpa e em cuidar do planeta.
Infelizmente, essa moçada ainda não é representativa quando olhamos o mundo dos investimentos. No Brasil, os jovens com menos de 25 anos representam apenas 1,16% do total de ativos em custódia capital alocados na B3, enquanto 72,74% estão na mão daqueles com mais de 45 anos, de acordo com o relatório da própria B3.

Na Vitreo a fotografia não é muito diferente. Os 11.245 jovens com menos de 25 anos representam menos de 2% do total de ativos em custódia aqui, enquanto 58% estão na mão daqueles com mais de 45 anos.

Um dia essa geração estará no topo da cadeia de investimentos. E, tomara, com as mesmas preocupações de hoje.

Mas não podemos ficar sentados, esperando o tempo passar. Temos que mudar, hoje, nossa atitude com o meio ambiente. Isto para não chegarmos daqui a alguns anos com remorsos por não ter ouvido mais um alerta do Bill Gates…

Leia o Diário de Bordo na íntegra:  clique aqui.