“Apesar do receio com a desaceleração da economia, a verdade é que o mundo tem vindo para os Estados Unidos”
Por William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue Securities
Na semana passada, comentei que teríamos dias intensos em termos de resultados corporativos. As maiores empresas da bolsa americana – Apple, Microsoft, Alphabet (dona do Google), Amazon e Facebook –, conhecidas como big techs, divulgaram seus números. Tais empresas, juntas, respondem por aproximadamente 23% do índice americano e somam mais de US$ 9 trilhões de valor de mercado. Logo, é normal que roubem a cena quando divulgam seus resultados. Em linhas gerais e de forma bem resumida, podemos dizer que o Google foi a big tech que apresentou o melhor resultado; a Amazon, a maior decepção; Apple e Microsoft bateram as estimativas, mas não trouxeram grandes perspectivas para frente; e o Facebook, apesar de resultados melhores que o esperado, apontou para um cenário mais complexo, olhando os próximos meses.
Para o investidor, acho importante ressaltar que todas essas empresas bateram as estimativas de mercado e reportaram resultados robustos, com crescimento de receitas, lucros e tudo mais. Quando digo que Amazon decepcionou, me refiro às expectativas de mercado. No curto prazo essas “decepções”, em um ou outro resultado, acabam pesando sobre a ação, mas ressalto que para o longo prazo o que importa de fato é a consistência de seus resultados, os quais, a meu ver, seguiram sendo a tônica neste semestre.
No nosso podcast diário comentamos cada uma delas – confira.
AGREGANDO…
De forma agregada, o que temos é: 91% das 275 empresas do S&P que divulgaram resultados bateram as estimativas do mercado, apresentando um crescimento de lucros de 86%; e 88% delas bateram as estimativas de receitas, com um crescimento médio de 24% de receitas – fonte de dados.
Outra forma de ver essa robustez dos resultados é por meio da evolução da margem de lucro das empresas. De acordo com a Factset, a margem de lucro líquido agregada das empresas do S&P 500 que divulgaram seus resultados foi de 12,4%, número maior que a média dos últimos cinco anos, de cerca de 10%. Confirmando-se, será a segunda maior margem de lucro líquido relatada pelo índice desde que a FactSet começou a monitorar essa métrica, em 2008, ficando atrás apenas do trimestre anterior.
EU FALO TUDO QUE ELA GOSTA DE ESCUTAR…
Fora os resultados, tivemos mais uma vez a autoridade monetária americana mantendo os juros inalterados e com um discurso bastante “dovish”, na expressão do mercado, ou seja, que aponta mais para os riscos de a economia não crescer, e com uma postura mais flexível em termos de política monetária. Na quarta, Jerome Powell, presidente do FED, disse que, apesar de a economia americana estar avançando rumo às suas metas, ainda existe um longo caminho até o banco central ajustar suas políticas expansionistas. Ele afirmou: “Nós temos algum caminho a percorrer no que diz respeito ao mercado de trabalho. (…) Acho que ainda estamos um pouco distantes de ter progresso substancial. Gostaria de ver alguns números fortes de emprego”.
O mercado gosta desse discurso… Juros baixos, compra de títulos, liquidez abundante. Powell novamente falou aquilo que o mercado queria escutar. Como cantava o Charlie Brown Jr.:
“Eu falo tudo que ela gosta de escutar. Deve ser por isso que ela vem me procurar”
O discurso de Powell jogou os juros americanos para baixo; em especial, a curva de 10 anos atingiu a mínima de 1.23%, na sexta-feira. Seu discurso também influenciou o dólar, que se desvalorizou frente a outras moedas e gerou um salto no ouro.
DIAGNÓSTICO CORRETO?
Mas, além de falar o que o mercado quer escutar, o FED talvez esteja correto no diagnóstico.
Digo isso porque um dia depois tivemos o dado de PIB do segundo trimestre nos EUA. Apesar do forte crescimento de 6.5% no 2T21, a verdade é que o número surpreendeu negativamente, dado que a expectativa era de um crescimento de 8.5%. O dado mais fraco se deveu a menores exportações, um consumo do governo mais fraco, bem como um arrefecimento no mercado imobiliário. Por outro lado, o gasto dos consumidores e os investimentos das empresas seguiram fortes, o que é bastante saudável para a economia.
A questão é que, de uma forma agregada, os últimos números da economia americana têm decepcionado – o gráfico abaixo, do Citi Economic Surprise, ajuda a mostrar isso.
Portanto, a retirada de estímulos muito prematura poderia jogar por água abaixo a recuperação percebida pela economia americana. Esse é um risco não desprezível, no qual o FED tem estado de olho.
O BARATO QUE SAI CARO E O CARO QUE SAI BARATO
Indo para o mercado, apesar do receio com a desaceleração da economia, a verdade é que o mundo tem vindo para cá. Matéria recente do Wall Street Journal (link) fala disso:
“Investors world-wide have funneled more than $900 billion into U.S.-domiciled mutual and exchange-traded funds, on a net basis, during the first half of the year, according to data compiled by Refinitiv Lipper.”
“Investidores em todo o mundo canalizaram mais de US$ 900 bilhões para fundos mútuos e negociados em bolsa domiciliados nos EUA, em uma base líquida, durante o primeiro semestre do ano, de acordo com dados compilados pela Refinitiv Lipper.”
Não por acaso, o diferencial de performance entre os mercados americanos e o resto do mundo veio abrindo, mesmo com muitos defendendo a ideia de que o mercado americano se encontra relativamente caro (negociando a um múltiplo de lucros maior que o resto do mundo).
Casos como o que aconteceu na China ajudam a explicar essa preferência pelo mercado americano. A intervenção estatal em diferentes segmentos de seus mercados afugentou investidores e, segundo estimativas, gerou perdas de US$ 1 trilhão (fonte). E esse não é um fato isolado. Regularmente vemos ou ouvimos casos de intervenções de mercados nocivos à atração do capital externo… Como brasileiros, nós entendemos bem disso, não é mesmo?
Portanto, o respeito às instituições de mercado tem um preço. Se muitos acham o mercado americano caro, é bom lembrá-los que muitas vezes o barato sai caro, e o caro é que sai barato.
Era isso pessoal, aquele abraço!!!
WILLIAM CASTRO ALVES