Não há remédio para a miséria crônica, falimos como civilização. A verba mais importante era a última na fila do pão, enquanto nos bastidores de Brasília bombou o banquete all inclusive de emendas parlamentares e do fundão eleitoral. Diz o ditado: farinha pouca, meu pirão primeiro. Pior que o individualismo capitalista é o incurável egoísmo do estadista, visto que o último perpetua. O cálculo político continua a gerar bons dividendos, enquanto o drama social é apenas mais uma moeda que serve ao discurso na hora da barganha.
Conforme a dialética do senhor e do sufrágio: prioridade é o poder, depois vem o povo, somente para reconhecer o tal poder.
Estava escrito nas estrelas que no último ano do mandato presidencial um polpudo bolsa família seria a política-socio-eleitoral priorizada. Isso porque o Bolsa Família, independente do nome que o recrie, é necessário, eficiente, minimamente humano e (porque não) dá votos.
Claro que ele precisa ser aperfeiçoado, principalmente no que se diz respeito a porta de saída, mas é bom ver que o conceito de renda mínima superou o embate ideológico, e que a briga hoje é pela paternidade do programa.
Por outro lado, é bom ver também jornalistas (mais à esquerda) defendendo o teto de gastos contra o populismo fiscal. Alguém lembra na época de Temer como esse debate foi travado? Tirar dinheiro da saúde, da educação e tal? Dinheiro tem, o que falta é prioridade. Além do mais, é preciso preservar o valor do dinheiro.


Com as ruas virando abrigos, barracas nas praças e papelões nas calçadas, a miséria é comum a todos. Impossível desviar dela. Impossível esquecer dela. Ela a todo instante nos aborda e cobra algumas poucas moedas. Cobra humanidade. E nos perguntamos, ao abrir a carteira em meio ao risco de assalto, ao procurar aquela nota de dois reais que já não compra nada, se a esmola somente alimentará mais a miséria? Mas logo se percebe que a miséria se tornou tão grande que isso não seria nem mais uma questão, e que por mais generoso que venha o gesto, aquilo é uma gota d’água no oceano, e aquele indivíduo a sua frente, aquela fome particular, é a realidade de milhões, numa escala que por si só desumaniza.
O drama do orçamento é que se o posto Ipiranga fosse uma farmácia, Paulo Guedes ia estar na frente pedindo pacotes de fraldas para revender.